quarta-feira, 6 de abril de 2011

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Os últimos séculos foram pródigos em teorias sobre a natureza da música. Autores com maior prentensão de originalidade chegaram mesmo a sugerir que a música não teria uma substância específica, sendo pura como os triângulos ideais do geômetra grego. Por esse tempo já se sabia, contudo, que os triângulos são o produto de uma convenção, uma descrição arbitrária do universo. Podem ser produzidos em vários tipos de espaço, mas não se pode exigir de filósofos da música um conhecimento extenso das matemáticas.
O compositor dessa cantata, por sua vez, não se cansa de mapear, no sentido matemático do termo, suas melodias sobre o plano do real. Descobre correspondências, estabelece simetrias e revela formas imprevistas. No micro, o macro; no macro, o micro. Alguns compositores descrevem paisagens arcádicas; outros, supostas desventuras amorosas; mas aqui ele prefere estabelecer a dinâmica da memória. Na verdade, a persuasão da lembrança necessária, o memento terrível do passado, a definir os atos do presente.

A respiração do primeiro coro é exatamente o que promete: a insistência da lembrança. Guardar no seu mais íntimo domínio o fato fundamental sobre Jesus Cristo: que renasceu dentre os mortos, como escreveu Tímóteo. As vozes em contraponto trazem a mensagem da consciência e revelam algo sobre a operação da memória.

O resto, o confronto entre o tumulto do mundo e a voz de Jesus e o cântico sobre o Príncipe da Paz, são outras obras primas musicais, mas vêm depois. Muito depois da recordação.


Halt im Gedächtnis Jesum Christ, der auferstanden ist von den Toten.


“Lembra-te de que Jesus Cristo ressuscitou dos mortos”. (2 Timóteo: 2.7)