quarta-feira, 7 de abril de 2010

79

Existe aqui certamente um tipo maravilhoso de inocência. É preciso atenção para perceber, deixar que o ouvido se enrede na aparente turbulência de trompetes e tímpanos. Sob o esplendor barroco e sob a glória de uma melodia feita para acompanhar as ondas do mar e os cortejos magníficos, filtra-se a ingenuidade dos versos do Salmo, a confiança alegre das crianças que correm em um pátio. Ouvimos e queremos ouvir de novo: ela nos devolve a infância, a crença absoluta em um mundo bom, o gosto de estar protegido e seguro.

Esse mundo tão sem perigos nunca envelhece. A ária para soprano canta deliciosa e declama contra cães blasfemadores, soando quase engraçada. Para que não esqueçamos, contudo, a fanfarra, ela retorna de tão gostosa, agora como prece de graças ao Senhor. O dueto seguinte repete a mesma alegre inocência: é um jogo de vozes, uma corrida, uma disputa, cujo som, uma vez ouvido, nunca é esquecido.

No coral final, acabou a merenda e tocou o sinal do fim do recreio. As crianças fazem silêncio e a professora comanda uma prece, o pedido para que tudo continue como é, para que nossos corações continuem inocentes: guarda-nos na verdade, dá-nos a liberdade. Quando chega essa música, é quase noite.

Bendito seja o artista que, não tendo como nos devolver a inocência alegre dos dias de criança, abre uma delicada janela. Dela ao menos contemplamos o que perdemos, o que não temos mais. Bendito seja o seu nome.


"Gott der Herr ist Sonn und Schild. Der Herr gibt Gnade und Ehre, er wird kein Gutes mangeln lassen den Frommen."


“O Senhor Deus é sol e escudo; o Senhor dará graça e glória; não negará bem algum aos que andam na retidão.” (Salmo 84, 12)



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