domingo, 13 de dezembro de 2009

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Existe uma fórmula matemática relacionando todos os seus símbolos fundamentais. Nela estão organizados em uma igualdade a base dos logaritmos naturais e, o número π, o imaginário i, assim como os algarismos 1 e 0. Existe um verso Evangelho que enfeixa todos as questões do cristianismo. Nele, Jesus responde a uma interrogação dos fariseus afirmando que se deve a César o que é de César. As condições para a obediência aos dois mundos do Homem foram fixadas com uma concisão notável. Sobre o versículo paira um ideal de Justiça, superior à letra de qualquer lei, persuasivo por sua própria precisão.

Como seria possível transformar em música uma idéia tão abstrata? Não estamos diante de um afeto humano, um sentimento classificável, uma reação emotiva do espírito cujo movimento interno pudesse ser descrito com o uso de recursos retóricos convencionais. A alma não está descendo, junto com alguma escala musical, a uma profundeza dramática; os anjos não estão fazendo soar um siciliano ao lado do berço de Jesus, o bom Pastor. O versículo do Evangelho não fala da reparação de uma injustiça ou da sabedoria de um juiz. Fixa um princípio, uma relação de equivalência.

O segredo da criação musical, portanto, está em não fugir dessa concisão retórica. Refletir uma distribuição abstrata, fixar posições no espaço das idéias e reconhecer a natureza cíclica da resposta de Jesus aos fariseus. Aqui, isso; lá, aquilo: como um veredicto de Salomão. O verso tem seis sílabas; o núcleo da melodia tem seis notas; começa em um Fá# para retornar à mesma nota. A cada um, apenas o que é seu. O mais lógico ideal de Justiça, controverso no mundo real, límpido na voz do violoncelo.

A secura intelectual dessas alturas musicais poderia ter deixado satisfeito um criador menos ambicioso. Não foi o caso, pois logo à frente, no dueto para alto e soprano, a mesma idéia de movimento, de distribuição de quantidades justas, de repartição correta, ganha uma versão mais apaixonada onde o fiel pede Toma-me de mim e dá-me a ti!. O que representa, obviamente, um excesso barroco que não se deixa conter pelo rigor das matemáticas ou do versículo do Evangelho.


Nur jedem das Seine!
Muss Obrigkeit haben
Zoll, Steuern und Gaben,
Man weigre sich nicht
Der schuldigen Pflicht!
Doch bleibet das Herze dem Höchsten alleine.




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